quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Igreja promove baile especial para surdos no Rio de Janeiro

Igreja promove baile especial para surdos no Rio de Janeiro




O gari Aleandro Lopes é daqueles que dança conforme a música. Mas só quando a pista está bombando mesmo. Vítima de meningite na infância, ele perdeu a audição, mas não o rebolado. E, sem a vassoura, passou a riscar os salões na companhia da potência das caixas de som, de preferência no volume máximo. A última vez foi no primeiro Baile para Surdos, em Sulacap, onde o público entrou num só ritmo, o da inclusão social.
— Eu frequentava o baile funk do Grêmio de Realengo, mesmo sem ouvir nada. Ia com amigos, dois surdos e o resto ouvinte. Lá, ficava juntinho das caixas de som. A roupa mexia, e eu dançava — gesticula em Libras Aleandro, a sua língua oficial.
Aos 34 anos, Aleandro quis sentir novamente a vibração das ondas sonoras de cada música no Baile para Surdos, promovido pela Igreja Batista Betânia. Fã de forró atualmente, chegou com a mulher, a operadora de máquina Zaira Moraes, de 37 anos, surda de nascença. Usando um aparelho auditivo, ela conta que a mãe teve rubéola durante a gravidez.
— Me senti ótima aqui. Deu até para lembrar os velhos tempos. Eu frequentava pagode e forró. E dançava em festas de casamento — disse Zaira, grávida de 8 meses.
A caixa de som virada para o chão: vibração aumenta e ajuda os frequentadores do baile de Sulacap
A caixa de som virada para o chão: vibração aumenta e ajuda os frequentadores do baile de Sulacap Foto: Urbano Erbiste / Extra
Já a dona de casa Areta Rocha Vieira, de 30 anos, vibrava a cada música, é claro. Portadora de um marcapasso, o coração dela também pulsou na frequência do som. E de felicidade, já que ela, surda, tinha vergonha de dançar na frente dos outros:
— É a primeira vez que danço em uma festa. Nos casamentos eu só fico sentada. Acho que as pessoas me olham com preconceito (devido à surdez).
O namorado, Leonardo Dias, de 22 anos, nem esquenta. Com o preconceito.
— As pessoas olham e riem. Já aconteceu de me verem dançando em um casamento e balançarem a cabeça negativamente. Mas eu não ligo para isso — conta ele.
Funcionária de uma fábrica, Priscila Rodrigues, de 26 anos, também não. De calça jeans, blusa rosa e bolsa trançada no corpo, ela tascou na boca a mistura do batom vermelho com o rosa e chegou no baile disposta a balançar o corpo na pista de dança. E também o coração:
— Nunca fui a um baile. Só dancei em festa de aniversário. E sei que a pista está bombando quando a vibração da música fica forte. Mas queria um namorado.
DJ surpreso com convite
O público do baile chegou a um espaço anexo à igreja quase que falando pelos cotovelos. O "bate-mão" (sinônimo de bate-papo) só silenciou quando o DJ Fagner Henrique, de 27 anos, começou a tocar. Música eletrônica, de preferência, como a de David Guetta.
Apesar da experiência em festas de aniversário, Fagner balançou quando ouviu, em alto e bom som, o convite da igreja, o de tocar para quem não ouve nada.
— Contei para alguns amigos, e eles me perguntaram se faria mímicas. Mas escolhi as músicas que têm mais grave e, quando vi eles dançando, fiquei surpreso. Agora, como fazem para traduzir a música para a emoção, eu não sei explicar — admite.
Responsável pelo baile, a sanitarista Aline Albuquerque, de 30 anos, sabe. Integrante do Ministério Efatá, que trabalha na igreja com ações sociais para pessoas com deficiências, ela conta que o grupo percebeu a necessidade de promover um lazer saudável para os surdos, "livrando eles do uso de drogas ou de bebidas".
— A ideia é colocar o som no grave para aumentar as ondas de vibração. Eles sentem a vibração, captam o ritmo e dançam — disse Aline.
Das seis caixas grandes e amplificadas, algumas foram viradas para as paredes. Outras, aumentavam o impacto da música viradas para o chão, em cima de tablados.
Mas o baile, gratuito, não é gospel. Ao contrário, está aberto a todas as religiões. E a paquera é permitida.


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